“‘Por que você e a mamãe dizem Eu te amo? Tipo, no telefone. Vocês não estão juntos, então por que dizem isso?’
‘Bom, pense em todas as pessoas para quem você diz isso. Seus avós, tios e tias…’
‘Mas eles são família.’
‘Bem, sua mãe é família.”
— Aftersun
Gosto muito da minha vida como ela é hoje, no que diz respeito à minha casa e ao meu relacionamento, mas tem dias em que eu resolvo correr pro meu quarto antigo, na casa dos meus pais, só pra passar um tempinho lá.
É que algumas coisas fogem da memória muito rápido. Elas não te acompanham quando você se muda. Permanecem lá, nesse lugar que por tanto tempo foi o seu lugar.
Aqui vão 5 coisas que eu não quero esquecer sobre o meu antigo quarto:
Os estalidos da cortina quando o vento bate nela.
O jeito como a luz do sol faz o cômodo inteiro ficar meio dourado entre 4h e 5h da tarde.
A maçaneta virando um segundo antes da minha mãe aparecer pra me dar oi ao chegar do trabalho, só pra se certificar de que eu tava em casa.
O desnível da escrivaninha que meu pai fez quando eu tinha uns dez anos, na qual escrevi pelo menos cinco livros. O desnível era um problema, e me irritava que a mesa voltava a ficar bamba não importava a gambiarra que eu fizesse, mas por algum motivo é importante não esquecer disso. As imperfeições também fazem de um lugar o que ele é.
O jeito como meu pai parava à minha porta e ficava dois ou três segundos em silêncio antes de falar o que queria. E quando ele precisava de ajuda com alguma coisa, algo que dependia da minha boa vontade, eu sempre sabia disso antes que ele chegasse no quarto, porque os passos dele tinham um ritmo diferente. Num desses dias em que voltei ao meu antigo quarto e tava na cama escrevendo, meu pai fez isso de novo: parou na porta e deixou aqueles segundinhos de suspense transcorrerem antes de falar. E mesmo antes de ele dizer qualquer coisa eu comecei a rir, porque tinha lembrado de como eu sempre antecipava os pedidos dele — os passos, a pausa, fragmentos de familiariade que por pouco não se esvaíram da minha memória. Uma das partes boas de ser adulto é que eu tô sempre disponível pra ajudar meus pais, diferente daquele adolescente que não queria sair do quarto.
Até a próxima semana.
Denys
Muito lindo a descrição dos detalhes do cotidiano, e mais lindo ainda é a sensibilidade que te fez observar isso tudo. Somos feitos desses detalhes, também.
esse texto me deu uma saudade gostosa do meu antigo quarto na casa dos meus pais…