Faz um ano desde a primeira publicação dessa newsletter, que foi uma tentativa desesperada de colocar algumas coisas amargas pra fora, em especial minha incapacidade de escrever.
Hoje, o problema mudou um pouco: estou escrevendo, mas faz mais de um mês que estou preso no mesmo capítulo, e sou o tipo de escritor que não segue em frente enquanto não fica satisfeito com uma cena. Eu sei, isso me deixa num estresse louco, mas pelo menos o trabalho de edição vai ser menor lá no futuro, né?
Né??
Nem sempre fui assim. O primeiro rascunho de Sem raízes foi escrito em 2018. Naquela época, escrevi o romance inteiro em 3 meses. A história era o sangue nas minhas veias. Ela vertia pelos meus poros, resvalava entre meus dedos. Era a lente pela qual eu enxergava o mundo todo. Eu tinha esse fogo que só se apagava se eu sentasse na cadeira e escrevesse.
Não tem fogo agora. As palavras arranham minha garganta quando tento colocá-las pra fora. Preciso obrigá-las a se soltarem de mim. Vivemos uma luta constante, eu e elas, nos atracando feito bichos. As palavras estão entre os bichos mais selvagens que vagam pelo mundo.
Mas.
Volta e meia eu penso nessa tirinha. Vi pela primeira vez compartilhada pelo Lauro Kociuba, depois ela voltou a mim pela newsletter da
. Foi criada por esse cara chamado Pascal Campion, que passei a acompanhar desde então.Fico tentando decifrar o escritor de agora, esse que não larga mão da mesma cena, indo e vindo pelas palavras até que elas façam sentido — sem saber se, no final, elas vão funcionar para alguém além dele mesmo. Talvez não sejam as palavras que ficam se agarrando a mim, talvez seja eu que não queira soltá-las. Mas por quê?
Toda vez que falo sobre isso na terapia eu me sinto um disco arranhado. Não consigo escrever. Não é mais tão fácil. Avancei nessa e nessa área da vida, mas meu livro anda meio parado. Ou então: Eu finalmente voltei a escrever pra ficar feliz, só porque eu amo fazer isso, e aí na sessão seguinte já estou repetindo as mesmas palavras de antes.
Penso na tirinha pra tentar me acalmar. Me vejo naquele carinha conversando com o gato.
Não sou mais uma explosão caótica de criatividade. Não sou mais um oceano revolto. Ainda existe uma energia forte aqui dentro, só que ela não é mais uma explosão, é uma brasa acesa.
E uma brasa ainda queima. Bem devagar, mas queima.
Mas voltando à cena em que estou preso.
Sem raízes é um middle grade1 em que um menino de 10 anos, Miguel, descobre um mundo subterrâneo onde vivem criaturas meio gente, meio árvore.
Nesse momento da história, Miguel e seus novos amigos estão caminhando ao longo de um rio chamado Rio das Palavras. Quando os pensamentos estão em ordem, o rio da pé e a correnteza é tranquila. Mas se você tem muito medo, se está confuso ou passando por um grande sofrimento, o rio é fundo e a correnteza te arrasta junto com ela.
Esse rio não existia na primeira versão da história, mas acho que sei porque ele existe agora. Ele é a manifestação literária do meu cérebro, sempre brigando com as palavras. Parte de mim insiste: vai com calma, o rio dá pé, tu pode se equilibrar nas pedras. Outra parte diz: só se deixa afundar.
O objetivo é atravessar o rio, terminar o capítulo. Se vai ser a pé ou a nado, ainda não descobri.
As histórias que me acompanharam nos últimos meses
Percy Jackson, é claro. Só que eu não gostei da série da Disney. Talvez um dia eu escreva sobre isso, porque não ter gostado me deixa triste e escrever sobre tristeza é comigo mesmo.
Deltora Quest. Minha série favorita da infância/adolescência continua tão boa quanto antes (ainda bem).
Livros de escritores brasileiros com palavras belíssimas que quero roubar para usar: Vou sumir quando a vela se apagar, Flumën, A palavra que resta e Cidades afundam em dias normais (foi o primeiro da
que li depois de anos acompanhando a newsletter dela).
O que estou fazendo quando não estou escrevendo
Revendo séries: Once upon a time, que me faz enxergar a vida com mais magia, e One day at a time, que me faz rir daquele jeito que desanuvia a cabeça.
Assitindo séries novas: Bom dia, Verônica, que desgraça minha cabeça mas mantém eu e a Andressa na ponta do sofá, e O último Mestre do Ar, que deu uma surra em Percy Jackson no quesito entretenimento.
Estudando: quero muito largar o gerenciamento de redes sociais e trabalhar apenas com criação de sites. Vou conseguir dar uma sacudida na vida? Vou me frustrar daqui duas semanas e desistir de novo? Aguardemos os próximos capítulos.
Por falar em middle grade, já conhece a coletânea Camp 51? Ela foi organizada por mim em parceria com a Editora Corvus e tá cheia de histórias divertidas sobre crianças em um acampamento de verão tentando sobreviver a uma invasão alienígena. Meu conto é uma mistura de prosa e roteiro pra cinema, e foi uma das histórias que mais me diverti escrevendo até hoje.
Eu também sinto a mudança no meu ritmo de escrita. O negócio é tentar abraçar esse novo processo e ver o que ele tem pra oferecer. Espero que logo venha coisa boa por aí! ☺️
Sempre fico animada quando chega novidades tua. Sempre há algo em que eu me identifique. Tenho a vontade, tenho a ideia e quando sento pra escrever parece que as palavras somem, ou que tudo está uma grande merda. No meu caso meu rio é de uma insegurança profunda...
Torço para que o teu rio se alinhe com as palavras que necessita.
Sempre aqui aguardando por mais!
Abraços